Quem é o Rico?
Qualquer cidadão do século XX, mesmo bastante pobre, tem grandíssimas possibilidades de ser considerado rico, em comparação com os tipos de benefícios e facilidades oferecidos no tempo de Jesus. Por isso, interpretar a passagem do Evangelho sob a chave meramente econômica não parece esclarecer muito a mensagem de Cristo, visto que hoje praticamente todos os pobres e alguns muito pobres seriam classificados por ricos, se comparados aos primeiros ouvintes do Senhor. O escândalo do Evangelho deve apontar para algo além dos bens exteriores
Água encanada, eletricidade, aparelhos de refrigeração, roupas produzidas por máquinas, pão fresquinho a cada 15 minutos e sem resquícios de cinza, sorvete, não andar 10 km por dia para vender o frango abatido na noite anterior, anestesia, plástico, velcro e fita adesiva, todos esses detalhes da vida cotidiana do homem do século XX faz com que vejamos com outros olhos a ostensiva ameaça que Nosso Senhor faz aos homens ricos de seu tempo:
“Um rico dificilmente entrará no Reino dos Céus” (Mt 19, 23).
O texto é sequência imediata do diálogo que Jesus teve com o Jovem Rico. Ao convite do Senhor à perfeição, que exigia abdicar dos muitos bens que possuía, saiu o Jovem entristecido. Nesse contexto é que a reprimenda acima é apresentada: “um rico dificilmente…” (Mt 19, 23). Perceba que o evangelista utiliza de um artifício incomum, um advérbio de modo: “dificilmente…”. Além do destaque para essa ferramenta literária, o relato diz que o Senhor Jesus insistiu no aviso: “Repito…”. Todo o cuidado e a insistência sobre o perigo das riquezas demonstrado nesses versículos apontam para a gravidade do assunto. Por isso, é fundamental entender quem é o rico que não entrará no Reino dos Céus.
Qualquer cidadão do século XX, mesmo bastante pobre, tem grandíssimas possibilidades de ser considerado rico, em comparação com os tipos de benefícios e facilidades oferecidos no tempo de Jesus. Por isso, interpretar a passagem do Evangelho sob a chave meramente econômica não parece esclarecer muito a mensagem de Cristo, visto que hoje praticamente todos os pobres e alguns muito pobres seriam classificados por ricos, se comparados aos primeiros ouvintes do Senhor. O escândalo do Evangelho deve apontar para algo além dos bens exteriores.
Supondo que a reprimenda do Senhor não se baseia na simples posse de bens (pois desses bens hoje se tem mais quantidade e qualidade que muitos Césares romanos), resta afirmar que não aos objetos mesmos mas ao apego aos bens é que se levanta a crítica do Senhor: ao se recusar vender os bens o jovem rico entristeceu-se. Veja que a crítica não se levanta por possuir o jovem tais bens, mas por não aceitar o convite de liberar-se deles para conviver com o Senhor. Essa é a ideia por detrás da imagem da agulha e do camelo. É preciso aceitar a lei eterna da riqueza: um dia a ferrugem a corrói tudo o que hoje brilha. Não se pode exigir o impossível prendendo-lhe o coração e a alma. Procurar subterfúgios para diminuir o tamanho do camelo ou aumentar a largura da agulha só provam o apego que o homem pode submeter-se a fim de garantir um pouco mais de alegrias nessa vida.
Enquanto não desprendermos o coração dos bens que nos cercam, não será possível receber com alegria o chamado de Cristo: sede perfeitos! Amar as coisas acima de Deus é idolatria e Ele é um Deus Ciumento, não tolera um coração com dois senhores. O rico de quem Jesus fala é o idólatra, que não põe Deus acima de seus negócios e interesses.